Monday, May 22, 2006

Ele e ela / Ela e eu

Ele foi feito com pressa e urgência
Ela com uma preguiça cadente
Ele foi feito na orgia
Ela entre quatro paredes
Tinha uma platéia que aplaudia e observava a feitura dele...
Na dela, os expectadores eram santos hipócritas pregados num altar...
Na confecção dele tinha cana e fumaça de cigarro barato ditando o tom
Na dela tinha incenso, mirra e canto gregoriano
Antes da mãe dele tentar descobrir o outro dono da barriga, não houve gozo
A mãe dela continuou dividindo espaço com um homem no qual foi presa, graças a deus
A mãe dele transou por dinheiro com vários homens antes de conceber
Ela veio ao mundo ensangüentada e inchada como ele
E eu nem tinha nascido, cheguei do mesmo jeito 7 anos depois!

Brejinho, maio de 2006.
leo bento

Sunday, May 07, 2006

Alguma coisa acontece em meu coração

Sabia que algo estava prestes a acontecer quando desse início àquela travessia. No meu caso, não foi no coração. Foi no peito, foi na consciência, foi na pele, foi no âmago! Puta merda, os versos não saíam da cabeça, mas quando me deparei com o cruzamento, e dei conta da realidade em minha volta. O verso já havia morrido e eu nem sabia que iria enterra-lo dali há poucos minutos. Estava tudo muito cinza pra sentir o que Caê nos sensibilizou em outros tempos. Dessa vez não deu. A merda é ter quase certeza que não dará, a não ser que... assim, quando cruzei a Ipiranga com a Avenida São João nada acontecia em meu coração, absolutamente nada. Sabe porque? Não! Então vamos lá. Na esquina tinha uma mulher negra linda lançando um sorriso tenebroso em minha direção. Lambia os lábios e se encontrava indignamente posicionada. Tinha o rosto muito, mas muito familiar. Ela estava pronta para abrir as pernas por um trocado qualquer. No meio da rua passeava um branco desses gordos de bem com a vida num carrão importado. Nem o nome eu conheço. Ele como muitos outros, passaram na mesma condição. Pareciam estar indiferentes com esquina. Grupos eram formados por malandros de calças largas, como as minhas. Malandros de ginga como a minha! Todos parecidos comigo. A única diferença é que tiveram coragem de deixar o cabelo crescer um pouco além e realizar uns corre pra se manter de pé. Vi um moleque de gude preto e magro. Lembrei dos tempos de criança. Estava com um odor fétido de cola. Me pedia algo sem saber o que era. Parei. Tentei entender o que ele queria... mas, assim, nem ele entendia o que estava pedindo. Merda! Sensação de impotência, de não posso fazer nada. É foda! Todos ali só queriam se alimentar, encher a barriga. Fiz minha parte. Depois, na minha indignação fumei um cigarro, bebi uma cerveja na mesma esquina onde nada, absolutamente nada aconteceu em meu coração. Tenho pra mim que ali parou de bater.

São Paulo, maio de 2006.
leo bento